14 março, 2016

Adrienne Rich

Na madeira velha, baratucha, riscada, da mesinha da máquina de escrever
há uma paisagem, feita de veios, que só uma criança pode ver
ou o eu mais velho da criança,
uma mulher sonhando quando devia estar a bater à máquina
o último relatório do dia.      Se isto fosse um mapa,
pensa ela, um mapa decretado para memorizar
podendo ela talvez percorrê-lo, ele mostra
cordilheira atrás de cordilheira esbatendo-se no deserto nebulento,
aqui e além um sinal de aquíferos
e um possível bebedouro.         Se isto fosse um mapa
seria o mapa da última idade da tua vida,
não um mapa de escolhas mas um mapa de variações
sobre a escolha maior. Seria o mapa pelo qual
ela poderia ver o fim das escolhas turísticas,
de distâncias azuladas e arroxeadas de romantismo,
pelo qual ela reconheceria que a poesia
não é revolução mas uma forma de saber
por que tem de vir a revolução.     Se esta mesinha de madeira baratucha,
produzida em massa porém duradoura, presente agora aqui,
é o que é porém um mapa-de-sonho
tão renitente, tão simples,
pensa ela, o material e o sonho podem juntar-se
e isso é o poema e isso é o relatório retardatário.


Adrienne Rich, Uma Paciência Selvagem  (trad. Mª Irene Ramalho e Mónica Varese Andrade)



13 março, 2016

Herberto Helder

O poema é um objecto carregado de poderes magníficos, terríficos: posto no sítio certo, no instante certo, segundo a regra certa, promove uma desordem e uma ordem que situam o mundo num ponto extremo: o mundo acaba e começa. Aliás não é exactamente um objecto, o poema, mas um utensílio: de fora parece um objecto, tem as suas qualidades tangíveis, não é porém nada para ser visto mas para manejar. 


Herberto Helder, (Auto-)Entrevista, Jornal Público, 4 dezembro 1990

11 março, 2016

Splendor in Purple

I never paint dreams or nightmares. I paint my own reality.
Frida Kahlo


CT, jacinto sobre paleta de F. (Splendor in Purple), 
março 2016


 



06 março, 2016

Joaquim Manuel Magalhães

Podei as sardinheiras de seis anos.
A meda dos ramos no telheiro
secou ao vagar de março,
enredou-se nos torcidos nós

aí teceram as aranhas, uma gata
pariu uma ninhada
e as milhariças negras e
castanhas com os paus de musgo

começaram por buscar insectos,
descobriram lugares aveludados,
tentaram esconder um ninho.

Línguas de ar sanguinolento
correm nos sulcos calcinados.
Nada. Nada quer dizer.

Joaquim Manuel Magalhães, Segredos, Sebes e Aluviões

05 março, 2016

anjos

O anjo solar, o outro das sombras
e esse que vagueia nos crepúsculos,
primeiro o da manhã, depois o do entardecer
desenham sinais que sigo para chegar a ti.

Joaquim Manuel Magalhães, Os Dias, Pequenos Charcos





















Kiki Smith

26 fevereiro, 2016

Mitsuhashi Takajo

Egipto, jaspe amarelo, 1353-1336 a.c.



























Ali o balão
insuflado de tristeza,
subindo no ar.

Mitsuhashi Takajo em O Japão no Feminino II, Haiku séculos XVII a XX,  trad.Luísa Freire


24 fevereiro, 2016

Kiripi Katembo (1979-2015)

Kiripi Katembo, Un Regard, 2011


Kiripi Katembo, Un Regard, 2011

23 fevereiro, 2016

Kiki e Uda

Kiki Smith, Nuit, 1992







































Aves, ramos, pedras
todos vestidos de branco - 
tempo de partir?

Uda Kiyoko em O Japão no Feminino II, Haiku séculos XVII a XX,  trad.Luísa Freire

22 fevereiro, 2016

bronze romano

21 fevereiro, 2016

Miguel Branco

Miguel Branco, Untitled (Dog), 2015

Mitsuhashi Takajo

CT, 2000



















A mulher de pé
sozinha, pronta a avançar 
pela Via Láctea.

Mitsuhashi Takajo em O Japão no Feminino II, Haiku séculos XVII a XX,  trad.Luísa Freire

20 fevereiro, 2016

Uda Kiyoko

CT, 1998




















Metade do corpo 
num sonho; a outra metade
dentro da neve.

Uda Kiyoko em O Japão no Feminino II, Haiku séculos XVII a XX,  trad.Luísa Freire

19 fevereiro, 2016

book

CT, book, 2016

















I am certain of nothing but of the holiness of the Heart’s affections and the truth of imagination.

John Keats

14 fevereiro, 2016