Falo daquilo que vejo, embora possas pensar que sou cego seguindo as mãos - sim, toco as palavras nas suas superfícies e utensílios. A primeira palavra que os olhos viram, agora que a recordo, parecia uma imagem - sim, um som desenhado como um fóssil (falo de fóssil, mesmo que ele demore a aparecer no que digo), um som do tamanho de um azulejo; agora que me lembro que era uma palavra que brilhava nos meus olhos ao vê-la (ver uma palavra era uma planta muito diferente, um oxigénio muito difícil de se respirar). Sim, agora vejo que falo, embora possas pensar que sigo pelo tacto a escrita. Sim, eu leio e decifro. E agora sei que oiço as coisas devagar. Daniel Faria, Poesia
Houvesse um sinal a conduzir-nos E unicamente ao movimento de crescer nos guiasse. Temos das árvores A incomparável paciência de procurar o alto a verde bondade de permanecer E orientar os pássaros Daniel Faria, Poesia
Repito a corrida na memória quando estou parado Penso velozmente que o amor, como Dante disse, é um estado De locomoção. É um motor. E fico a trabalhar no mecanismo secreto Do amor. Daniel Faria, Poesia
11 dezembro, 2014
A magnólia estende contra a minha escrita a tua sombra E eu toco na sombra da magnólia como se pegasse na tua mão
Daniel Faria, Poesia
29 dezembro, 2013
Homens que são como lugares mal situados Homens que são como casas saqueadas Que são como sítios fora dos mapas Como pedras fora do chão como crianças órfãs Homens agitados sem bússola onde repousem Homens que são como fronteiras invadidas Que são como caminhos barricados Homens que querem passar pelos atalhos sufocados Homens sulfatados por todos os destinos Desempregados das suas vidas Homens que são como a negação das estratégias Que são como os esconderijos dos contrabandistas Homens encarcerados abrindo-se com facas Homens que são como danos irreparáveis Homens que são sobreviventes vivos Homens que são sítios desviados do lugar Daniel Faria, "Poesia"