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21 abril, 2018

Estela e Heidi


(…)
que inveja,
penso eu
daqueles que só escrevem quando amam

que inveja,
penso eu
mas depois me arrependo
que inferno seria
só ser atravessada
quando algo respira.

Estela Rosa in  Oceânica


Heidi Kirkpatrick, Lost and Found




UM CAROÇO DE ABÓBORA JAPONESA

Aprendi
que se você joga um saco de terra no vaso
é incontrolável que surjam pequenas folhas

plantas sem nome
diria minha mãe
é tudo mato

mas resolvi jogar terra em um vaso
e ali algumas sementes que iam pro lixo

não me preocupei
nada do que planto dá
não tenho interesse em fertilidades

mas aí brotou por entre o lixo
uma folhinha

puxei o mato
mas ele saía do caroço da abóbora japonesa
do purê de semana passada

ela ali crescendo
orientalíssima em meu vaso de lixo orgânico
minha última tentativa de gratidão

com o broto na mão
fiquei pensando nos mestres japoneses
e naqueles samurais de coquezinho
naquelas moças com pés cortados
sapatos de madeira
nos budas de porcelana

e aquela folha ali brotando

então é isso, não dá
não sei lidar com vidas pacientes
com essa folha japonesa
delicada rompendo o lixo
feito um hexagrama de i-ching
me ensinando a brotar

mas não dá
é poesia demais pra mim
logo eu que não sei meditar


Estela Rosa (lida em Oceânica )