David Hockney, gravura sobre catorze poemas de Kavafis, 196 |
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18 agosto, 2019
Konstandinos Kavafis
À ESPERA DOS BÁRBAROS
O que esperamos nós em
multidão no Fórum?
Os Bárbaros, que
chegam hoje.
Dentro do Senado,
porquê tanta inacção?
Se não estão
legislando, que fazem lá dentro os senadores?
É que os Bárbaros
chegam hoje.
Que leis haveriam de fazer
agora os senadores?
Os Bárbaros, quando
vierem, ditarão as leis.
Porque é que o
Imperador se levantou de manhã cedo?
E às portas da cidade
está sentado,
no seu trono, com toda
a pompa, de coroa na cabeça?
Porque os Bárbaros
chegam hoje.
E o Imperador está à
espera do seu Chefe
para recebê-lo. E até
já preparou
um discurso de
boas-vindas, em que pôs,
dirigidos a ele, toda
a casta de títulos.
E porque saíram os
dois Cônsules, e os Pretores,
hoje, de toga
vermelha, as suas togas bordadas?
E porque levavam
braceletes, e tantas ametistas,
e os dedos cheios de
anéis de esmeraldas magníficas?
E porque levavam hoje
os preciosos bastões,
com pegas de prata e
as pontas de ouro em filigrana?
Porque os Bárbaros
chegam hoje,
e coisas dessas
maravilham os Bárbaros.
E porque não vieram
hoje aqui, como é costume, os oradores
para discursar, para
dizer o que eles sabem dizer?
Porque os Bárbaros é
hoje que aparecem,
e aborrecem-se com
eloquências e retóricas.
Porque, subitamente,
começa um mal-estar,
e esta confusão? Como
os rostos se tornaram sérios!
E porque se esvaziam
tão depressa as ruas e as praças,
e todos voltam para
casa tão apreensivos?
Porque a noite caiu e
os Bárbaros não vieram.
E umas pessoas que
chegaram da fronteira
dizem que não há lá
sinal de Bárbaros.
E agora, que vai ser
de nós sem os Bárbaros?
Essa gente era uma
espécie de solução.
Konstandinos Kavafis
29 julho, 2019
Konstantinos Kavafis
Cristina Tavares, TONDOS, 2018 |
Claro que é parecido este pequeno
retrato dele, a lápis.
retrato dele, a lápis.
Feito num momento, no convés do barco,
numa tarde encantadora.
O mar da Jónia a rodear-nos.
numa tarde encantadora.
O mar da Jónia a rodear-nos.
Parece-se com ele. Não era ele mais belo?
Sensível era a ponto de sofrer -
o que seu rosto iluminava.
Mais belo me aparece, agora que,
fora do Tempo, eu o recordo n'alma.
Sensível era a ponto de sofrer -
o que seu rosto iluminava.
Mais belo me aparece, agora que,
fora do Tempo, eu o recordo n'alma.
Fora do Tempo. Tudo isto é muito antigo -
o desenho, e o navio, e o entardecer.
o desenho, e o navio, e o entardecer.
Konstantinos Kavafis [1919]
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18 fevereiro, 2015
Vestes
Dentro de um caixote ou dentro de um móvel de ébano precioso vou pôr a guardar as vestes da minha vida.
As roupas azuis. E depois as vermelhas, as mais belas de todas. E a seguir as amarelas. E por fim de novo as azuis, mas muito mais desbotadas estas últimas do que as primeiras.
Konstandinos Kavafis, Poemas e Prosas, (trad. Joaquim Manuel Magalhães e Nikos Pratsinis)
Da Imaginação até ao Papel
CT, (...antes de partir para lisboa com o grego), 18 fev 2015 |
OS NAVIOS
Da Imaginação até ao Papel. É uma difícil passagem, é um perigoso mar. A distância parece curta à primeira vista, e embora seja assim quão longa viagem é, e quão prejudicial por vezes para os navios que a empreenderam.
O primeiro prejuízo provém da natureza assaz frágil das mercadorias que os navios transportam. Nos mercados da Imaginação a maior parte das coisas e as melhores são fabricadas de vidros finos e de cerâmicas transparentes, e com todo o cuidado do mundo muitas se partem no caminho, e muitas se partem quando as desembarcam para terra. E todo o prejuízo deste género é sem remédio, porque é impensável que o navio volte atrás para recolher coisas da mesma forma. Não há hipótese de encontrar a mesma loja que as vendia. Os mercados da Imaginação têm lojas grandes e luxuosas mas não de duração longa. As suas transacções são curtas, arrematam as suas mercadorias rapidamente e liquidam de seguida. É muito raro um navio voltar a encontrar os mesmos exportadores com os mesmos géneros.
Um outro prejuízo provém da capacidade dos navios. Partem dos portos dos continentes prósperos sobrecarregados, e depois quando se encontrarem em alto mar vêem-se obrigados a deitar fora parte da carga para salvar o todo. De tal modo que quase nenhum navio consegue levar completos tantos tesouros quantos recolheu. As coisas despejadas são obviamente os géneros de menor valia, mas por vezes acontece que os marinheiros, na sua grande pressa, cometem erros e deitam ao mar objectos preciosos. (...)
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