A poesia é um meio de conhecimento e acção de cujos frutos, bons ou maus, só o poeta aproveita (facto, este, de que muito poucos se dão conta) e daí a inutilidade dos esforços para ligá-lo a qualquer filosofia, política ou teologia, inutilidade que não se desmente no caso de ser o próprio poeta a fazer essa aproximação. É (foi) o caso de Régio como o de Mayakovsky: a sua voz continuará estranha e o sentido das suas palavras incompreensível mesmo para aqueles que escolheu como correligionários. É que o poeta é rebelde sem premeditação, demolidor de tudo e de si próprio, esforçadamente anti-caridade-encostada-às-esquinas-de-pistola-em-punho ou caneta-na-mão-lágrima-de-jacaré.
Perfecto E. Quadrado, A Única Real Tradição Viva - Antologia da Poesia Surrealista Portuguesa, excerto de Carta ao Egito, de Pedro Oom, 1949