Cada vez escrevo / produzo menos, mas o pouco
que produzo requer tempo. Requer toda a minha disponibilidade, toda a
minha paixão. Não posso continuar com coisas exteriores à minha escrita a
perturbarem-me. Tenho de avançar rapidamente com o projecto que me obceca há
muito. O tempo faz-se escasso.
Faz um frio de partir os ossos. Os dias
cheios dum sol espantoso, uma limpidez que se vê a costa até ao Cabo Sardão. Às
vezes desejaria ter sido pastor, homem transumante. Ir e regressar, com o sol e
com as chuvas, ir e regressar sempre com o ciclo das estações…
Fiz 36 anos, hoje, acabaram-se para sempre
algumas coisas, outras iniciam-se agora, só a juventude não se recomeça nem tem
início hoje… Tenho de começar a habituar-me à grande desolação dos dias, sempre
mais vazios, sem ninguém, porque assim o quis.
A partir de hoje tenho o tempo todo para
escrever, para não fazer nada, envelhecerei calmamente. Tenho a certeza. Não há
tempo, ainda bem!
Al Berto, "Diários"
(para a escrita de f)