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13 julho, 2019

Luís Miguel Nava

Rogier Van Der Weyden, Deposição da Cruz (detalhe), 1436



























As mãos são de qualquer corpo a coroa.


Luís Miguel Nava, no poema Ao Mínimo Clarão


07 agosto, 2015

Sonia e Luís (e também Blaise)


Sonia Delaunay, 1913
encadernação para o livro "Les Pâques" de Blaise Cendrars 























O corpo dividido em duas partes
fechadas
à chave uma na outra, avanço
num duplo coração como se fosse
ao mesmo tempo um só barco por dois rios.

Luís Miguel Nava, Poesia Completa 

25 julho, 2015

O céu agrada-me pensar que é a memória de dois ou três amigos, aqueles contra cujos lábios a partir de dentro empurraremos, docemente os nossos nomes e que, quando levam a comida à boca, sabem que é a nós que estão a alimentar. São dois ou três amigos, aqueles só em cujos corações enfiamos achas, o clarão atinge-lhes os olhos, pensarão: hoje a memória é como se a trouxéssemos em braços. Não sei se quando o mar lhes vier ao espírito o ouviremos rebentar, o certo é que por ele às vezes sobem as marés. Há ondas que se vê terem por ele passado antes de contra o nosso corpo deflagrarem.

Luís Miguel Nava, Poesia Completa 1979-1994, Publicações D. Quixote


Tristan Tzara, Paul Eluard, André Breton, Hans Arp, Salvador Dalí, Yves Tanguy, Max Ernst, René Crevel e Man Ray

12 novembro, 2014

A fala quer-se árida, de uma aridez idêntica à da roupa que nos cobre ou à do céu, de que me esforço, sempre que dele falo, por deixar à mostra um dos agrafos mais profundos.

Luís Miguel Nava, Poesia Completa

11 novembro, 2014

A própria alma é elástica: podemos, assentando um dedo sobre a sua superfície e pressionando-a, levá-la a tocar nas coisas mais inesperadas.

Luís Miguel Nava, Poesia Completa


Willy Verginer, 2007

30 dezembro, 2012




Rodin, "Masque de Camille Claudel",1884

A pele serve de céu ao coração.
Luís Miguel Nava


10 janeiro, 2008

Dennis e Luís


Dennis Oppenheim, "Annual Rings", 1969
DOIS RIOS
O corpo dividido em duas partes
fechadas
à chave uma na outra, avanço
num duplo coração como se fosse
ao mesmo tempo num só barco por dois rios.

Luís Miguel Nava, "O Céu Sob as Entranhas"

04 janeiro, 2008

Luís Miguel Nava, mais 4 poemas e 1 imagem



OS PRATOS DA BALANÇA
Por entre as rochas um rapaz, nas mãos levando uma balança, avança em direcção ao mar. Vai procurar pesá-lo. Num dos pratos, o mar há-de revolver-se, debater-se, rebentar, há-de trazer à superfície a força das entranhas e atrair o céu, há-de-o fazer precipitar-se até com ele se confundir, e as próprias rochas através das quais o rapaz segue hão-de pesar no prato ferozmente. Imperturbável, o rapaz colocará no outro prato o seu sorriso.


OLHANDO O SOL
Um dia, olhando o sol, deu conta de que nele tinha os ossos mergulhados. Era no entanto impensável proceder a escavações no sol, embora tarde ou cedo a gente acabe por sentir no coração as escavadoras. Dir-se-ia um sol magnético capaz de decidir dos resultados das mais árduas partidas de xadrez. Como se fosse uma das peças, dir-se-ia, ou como se a luz dele recuperasse através deste uma etimologia insuspeitada.
Há quem em si se embrenhe até lhe dar o coração pela cintura – começou ele a escrever então. Como se a espinha do próprio acto de escrever ficasse à mostra, a mão foi-lhe emergindo aos poucos do papel.

Luís Miguel Nava, “Rebentação”

UMA CANDEIA
Poisei na margem desta folha uma candeia, para que se tornassem mais claras as palavras deste texto. Uma candeia também ela feita de palavras e que, contrariamente às aparências, não está na margem mas dispersa nas palavras, de tal forma que, se eu falar das praias, por exemplo, o próprio olhar dos leitores torna visíveis os contornos dos banhistas.

CÉU ÁRIDO
Devemos, ao falar, ter o máximo cuidado com as palavras que empregamos, pois, sendo algumas delas vulneráveis às raízes, arriscamo-nos a ver apoderar-se-nos da fala uma vegetação que talvez chegue mesmo a destruir-nos. A fala quer-se árida, de uma aridez idêntica à da roupa que nos cobre o corpo ou à do céu, de que me esforço, sempre que dele falo, por deixar à mostra um dos agrafos mais profundos.

Luís Miguel Nava, “O Céu Sob as Entranhas”

Luís Miguel Nava 2 poemas

CRAWL
Às vezes, entranhando-me num espelho, consigo dar nele duas ou três braçadas sucessivas.

CISÃO
Gostava de saber até que ponto a ideia de céu e a de unidade andam ligadas. Só assim poderia avaliar que peso tem o facto de eu sentir que o céu se encontra dividido e uma das partes se alojou transversalmente no meu corpo. Tal é às vezes o seu peso, que me vejo constrangido a andar dobrado.

Luís Miguel Nava