(...) a poesia é a relação pura do homem com as coisas. Isto é: uma relação com a realidade, tomando-a na sua pura existência. O poeta é aquele que vive com as coisas, que está atento ao real, que sabe que as coisas existem.
Sophia de Mello Breyner Andresen, Colóquio, nº8, Abril 1960
02 abril, 2015
28 março, 2015
Março é o Mês da Expectativa.
As coisas que não conhecemos –
As pessoas que fazem previsões
Vêm agora –
Tentamos mostrar alguma firmeza –
Mas a pomposa Alegria
Trai-nos, como o primeiro Noivado
Trai um Rapaz.
Emily Dickinson , trad. © Cristina Tavares, 2015
March is the Month of
Expectation./The things we do not
know – / The Persons of
prognostication / Are coming now – /We try to show
becoming firmness – / But pompous Joy / Betrays us, as his
first Betrothal / Betrays a Boy.
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26 março, 2015
Emily e eu e Ilse
A Beleza
não se provoca – Ela é –
Persegue-a, e ela cessa –
Não a procures, e ela habita.
Persegue-a, e ela cessa –
Não a procures, e ela habita.
Emily Dickinson , trad. © Cristina Tavares, 2015
Beauty is not caused — It is — / Chase it, and it ceases — / Chase it not, and it abides.
Beauty is not caused — It is — / Chase it, and it ceases — / Chase it not, and it abides.
Ilse Bing, Paris, 1952 |
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25 março, 2015
herberto - a sua matéria fugitiva
...
Os símbolos saem da noite terrena - rápidos e luzentes - referidos como flores
ou pássaros, e a mesma noite reabsorve a sua matéria fugitiva. Porque a noite
não é terna. Desta noite que fermenta silenciosamente destaca-se o nosso
vocabulário, ele já sistema básico de símbolos, pronto para o jogo e o uso
apocalípticos. Mexer neste vocabulário é uma incorrência em perigos incógnitos,
e nessa aventura (e não nas passagens fotográficas) lavra-se a biografia
criminal, e a exposição à morte. (...)
Herberto Helder; Profissão: Revólver, & ETC,
nº19, Janeiro de 1974
Vivian Maier, Chicago, Junho 1963 |
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V
24 março, 2015
Escrever não mostra o que resta, mas o que falta. Para tocar o fundo. Disso se morre, de escrita. Mas nada vale senão morrer. O sentido revelador disto está em que tudo desaparece com cada um. Morre-se para que o mundo morra, e crime e culpa se dissolvam, como se a escrita – morte alheia e própria – fosse uma espécie de exasperada, misteriosa e emblemática regeneração ..."
Herberto
Helder, Profissão: Revólver, & ETC,
nº19, Janeiro de 1974
Herberto Helder |
Herberto Helder, Angola, 1961 |
Herberto Helder (fotografia do espólio de Alberto Lacerda) |
Herberto Helder (fotografia de Alfredo Cunha, fevereiro de 2015) |
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Herberto
queria ver se chegava por extenso ao contrário:
força e pulsação e graça,
isto é: a luz, de dentro, despedaçando tudo,
e concentrada:
estrela / estrela
Herberto Helder, A Morte Sem Mestre
força e pulsação e graça,
isto é: a luz, de dentro, despedaçando tudo,
e concentrada:
estrela / estrela
Herberto Helder, A Morte Sem Mestre
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Herberto
tão fortes eram que sobreviveram à língua morta,
esses poucos poemas acerca do que hoje me atormenta,
décadas, séculos, milénios,
e eles vibram,
e entre os objectos técnicos no apartamento,
rádio, tv, telemóvel,
relógios de pulso,
esmagam-me por assim dizer com a sua verdade última
sobre a morte do corpo,
dizem apenas: é igual ao pó da terra que não respira,
o que é falso, pois eu é que deixarei de respirar
sobre o pó da terra que respira,
entre o poema sumério e este poema de curto fôlego,
mas que talvez respire um dia,
ou dois, ou três dias mais:
quanto às coisas sumérias: as mãos da rapariga,
o cabelo da estreita rapariga,
a luz que estremecia nela,
tudo isso perdura em mim pelos milénios fora,
disso, oh sim, é que eu estou vivo e estremeço ainda
Herberto Helder, A
Morte Sem Mestre
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23 março, 2015
20 março, 2015
Hölderlin e Rachel
19 março, 2015
15 março, 2015
Adélia Prado
Fluência
Eu fiz um livro, mas oh meu Deus,
não perdi a poesia.
Hoje depois da festa,
quando me levantei para fazer café,
uma densa neblina acizentava os pastos,
as casas, as pessoas com embrulho de pão.
O fio indesmanchável da vida tecia seu curso.
Persistindo, a necessidade dos relógios,
dos descongestionantes nasais.
Meu livro sobre a mesa contraponteava exato
com os pardais, os urinóis pela metade,
o antigo e intenso desejar de um verso.
O relógio bateu sem assustar os farelos sobre a mesa.
Como antes, graças a Deus.
Adélia Prado, Com Licença Poética
Eu fiz um livro, mas oh meu Deus,
não perdi a poesia.
Hoje depois da festa,
quando me levantei para fazer café,
uma densa neblina acizentava os pastos,
as casas, as pessoas com embrulho de pão.
O fio indesmanchável da vida tecia seu curso.
Persistindo, a necessidade dos relógios,
dos descongestionantes nasais.
Meu livro sobre a mesa contraponteava exato
com os pardais, os urinóis pela metade,
o antigo e intenso desejar de um verso.
O relógio bateu sem assustar os farelos sobre a mesa.
Como antes, graças a Deus.
Adélia Prado, Com Licença Poética
14 março, 2015
Adélia
Era um quintal ensombrado, murado alto de pedras.
As macieiras tinham maçãs temporãs, a casca vermelha
do escuríssimo vinho, o gosto caprichado das coisas
fora de seu tempo desejadas.
Ao longo do muro eram talhas de barro.
Eu comia maçãs, bebia a melhor água, sabendo
que o mundo lá fora havia parado de calor.
Depois encontrei meu pai, que me fez festa
e não estava doente e nem tinha morrido, por isso ria,
os lábios de novo e a cara circulados de sangue,
caçava o que fazer pra gastar sua alegria:
onde está meu formão, minha vara de pescar,
cadê minha binga, meu vidro de café?
Eu sempre sonho que uma coisa gera,
nunca nada está morto.
O que não está vivo, aduba.
O que está estático, espera.
Adélia Prado, Com Licença Poética
As macieiras tinham maçãs temporãs, a casca vermelha
do escuríssimo vinho, o gosto caprichado das coisas
fora de seu tempo desejadas.
Ao longo do muro eram talhas de barro.
Eu comia maçãs, bebia a melhor água, sabendo
que o mundo lá fora havia parado de calor.
Depois encontrei meu pai, que me fez festa
e não estava doente e nem tinha morrido, por isso ria,
os lábios de novo e a cara circulados de sangue,
caçava o que fazer pra gastar sua alegria:
onde está meu formão, minha vara de pescar,
cadê minha binga, meu vidro de café?
Eu sempre sonho que uma coisa gera,
nunca nada está morto.
O que não está vivo, aduba.
O que está estático, espera.
Adélia Prado, Com Licença Poética
13 março, 2015
Hölderlin
Para onde irei eu?
Vivem os mortais
De soldo e trabalho;
Alternando em fadiga e repouso
Tudo se alegra; porque não dorme então
Nunca em meu peito o espinho?
Hölderlin, Poemas, trad. Paulo Quintela
Vivem os mortais
De soldo e trabalho;
Alternando em fadiga e repouso
Tudo se alegra; porque não dorme então
Nunca em meu peito o espinho?
Hölderlin, Poemas, trad. Paulo Quintela
10 março, 2015
E e E
One need not be a
chamber to be haunted.
Não precisamos de ser um quarto para se ser assombrado.
Emily Dickinson , trad. © Cristina Tavares, 2015
Ellsworth Kelly, Flower Drawing |
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