19 março, 2015

                                                                  














                 


   

















 CT, poética, março 2015   

          

16 março, 2015

Porque o belo significa o fim provável dos terrores.

Heiner Müller

15 março, 2015

santa clara

fonte da escola santa clara (Duarte, 10 anos)
O que a memória ama, fica eterno.
Adélia Prado

Adélia Prado

Fluência

Eu fiz um livro, mas oh meu Deus,
não perdi a poesia.
Hoje depois da festa,
quando me levantei para fazer café,
uma densa neblina acizentava os pastos,
as casas, as pessoas com embrulho de pão.
O fio indesmanchável da vida tecia seu curso.
Persistindo, a necessidade dos relógios,
dos descongestionantes nasais.
Meu livro sobre a mesa contraponteava exato
com os pardais, os urinóis pela metade,
o antigo e intenso desejar de um verso.
O relógio bateu sem assustar os farelos sobre a mesa.
Como antes, graças a Deus.

Adélia Prado, Com Licença Poética

14 março, 2015

Adélia

Era um quintal ensombrado, murado alto de pedras.
As macieiras tinham maçãs temporãs, a casca vermelha
do escuríssimo vinho, o gosto caprichado das coisas
fora de seu tempo desejadas.
Ao longo do muro eram talhas de barro.
Eu comia maçãs, bebia a melhor água, sabendo
que o mundo lá fora havia parado de calor.
Depois encontrei meu pai, que me fez festa
e não estava doente e nem tinha morrido, por isso ria,
os lábios de novo e a cara circulados de sangue,
caçava o que fazer pra gastar sua alegria:
onde está meu formão, minha vara de pescar,
cadê minha binga, meu vidro de café?
Eu sempre sonho que uma coisa gera,
nunca nada está morto.
O que não está vivo, aduba.
O que está estático, espera.

Adélia Prado, Com Licença Poética

13 março, 2015

Hölderlin

Para onde irei eu?
Vivem os mortais
De soldo e trabalho;
Alternando em fadiga e repouso
Tudo se alegra; porque não dorme então
Nunca em meu peito o espinho?

Hölderlin, Poemas, trad. Paulo Quintela
Francis Bacon, auto retrato, 1971

Francis Bacon

Francis Bacon, Auto retrato, 1973 

10 março, 2015

E e E

One need not be a chamber to be haunted.

Não precisamos de ser um quarto para se ser assombrado.


Emily Dickinson trad. © Cristina Tavares, 2015

Ellsworth Kelly, Flower Drawing

07 março, 2015

Cy

David Seidner, secretária de Cy Twombly

06 março, 2015

Be patient – even with chaos.

Lydia Davis

05 março, 2015

Marie Sondergaard Lolk, s/título, 2008

04 março, 2015

jean/hans Arp

Jean (Hans) Arp,
fotografia da colecção de Katherine S. Dreier

03 março, 2015



Jean (Hans) Arp, Around the Sun nº17, 1966

Jean (Hans) Arp, Terrestrial Forms, 1917

Jean (Hans) Arp

Jean (Hans) Arp, Forest, 1916

02 março, 2015

Ode a Walt Witman

(...)
E tu, belo Walt Witman, dorme nas margens do Hudson
com a barba virada ao pólo e as mãos abertas.
Argila branca ou neve, a tua língua chama
camaradas que velem tua gazela sem corpo.
Dorme,não fica nada.
Uma dança de muros agita as pradarias
e a América afoga-se em máquinas e pranto.
Quero que o ar forte da noite mais profunda
tire flores e letras do arco onde dormes
e um garoto negro anuncie aos brancos do oiro
a chegada do reino das espigas.

Federico Garcia Lorca, Poemas, trad. Eugénio de Andrade 

28 fevereiro, 2015

Federico Garcia Lorca, Las Manos Cortadas, 1935-36

Gazel da Morte Sombria

Quero dormir como dormem as maçãs,
afastar-me do tumulto dos cemitérios.
Quero dormir como dorme o garoto
que queria cortar o coração no mar alto.

Não quero que me repitam que os mortos não perdem o sangue;
que a boca podre continua a pedir água.
Não quero saber dos martírios que dá a relva,
nem da lua com boca de serpente
trabalhando antes de amanhecer.

Quero dormir um instante,
um instante, um minuto, um século;
mas que saibam todos que não morri;
que sou o pequeno amigo do vento Oeste,
que sou a sombra imensa de minhas lágrimas.

Cobre-me com um véu pela aurora,
porque me arrojará punhados de formigas, 
molha com água dura os meus sapatos
para que a pinça do seu lacrau resvale.

Quero dormir como dormem as maçãs,
aprender um pranto que me limpe a terra;
quero viver como o garoto sombrio
que no mar alto queria cortar o coração.


Federico Garcia Lorca, Poemas, trad. Eugénio de Andrade