08 fevereiro, 2018
07 fevereiro, 2018
04 fevereiro, 2018
Eugénio de Andrade
Que fizeste das palavras?
Que contas darás tu dessas vogais
de um azul tão apaziguado?
E das consoantes, que lhes dirás,
ardendo entre o fulgor
das laranjas e o sol dos cavalos?
Que lhes dirás, quando
te perguntarem pelas minúsculas
sementes que te confiaram?
Eugénio de Andrade, O Sal da Língua
03 fevereiro, 2018
Frederico Mira George
#38
pentearam-me arranjaram-me um fato
calçaram-me sapatos engraxados
e fecharam-me os olhos com pás de terra
cheira a mercúrio e a volfrâmio
as calças são boas mas apertadas - ?de quem terão sido
e os sapatos
/não cabiam - uma mãe rezando partiu-me as falanges
resultou na perfeição
antes da descida final
antes de ser posto o selo
a mulher mãe-rezadora envolveu-me um terço de rosário
nas mãos - prata brilhante
e desci - tranquilo
para a escuridão generosa
da plantação
continuo tranquilo apesar de não encontrar o coração
no peito nem sentir os olhos nas cavidades do crânio
quando rebentarem as primeiras folhas no solo
voltarei a ver o mar/a praça/os automóveis
os homens e as mulheres dentro dos automóveis
voltarei ao princípio - à cama onde nasci
descanso em paz enquanto germino
Frederico Mira George, Caixa Negra -1º vol., edições quási
pentearam-me arranjaram-me um fato
calçaram-me sapatos engraxados
e fecharam-me os olhos com pás de terra
cheira a mercúrio e a volfrâmio
as calças são boas mas apertadas - ?de quem terão sido
e os sapatos
/não cabiam - uma mãe rezando partiu-me as falanges
resultou na perfeição
antes da descida final
antes de ser posto o selo
a mulher mãe-rezadora envolveu-me um terço de rosário
nas mãos - prata brilhante
e desci - tranquilo
para a escuridão generosa
da plantação
continuo tranquilo apesar de não encontrar o coração
no peito nem sentir os olhos nas cavidades do crânio
quando rebentarem as primeiras folhas no solo
voltarei a ver o mar/a praça/os automóveis
os homens e as mulheres dentro dos automóveis
voltarei ao princípio - à cama onde nasci
descanso em paz enquanto germino
Frederico Mira George, Caixa Negra -1º vol., edições quási
Cristina Tavares, B&W, 2017 |
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02 fevereiro, 2018
Margaret Atwood
O MOMENTO
O momento em que, após anos
de labuta e uma longa viagem,
pões o pé no centro do teu quarto,
casa, hectare, quilómetro quadrado, ilha, país,
finalmente consciente de como lá chegaste,
e dizes, isto é meu,
é o mesmo momento em que as árvores
desenlaçam de ti os seus braços macios,
os pássaros recolhem a sua linguagem,
os penhascos estalam e desabam,
o ar recua de ti como uma onda
e ficas sem conseguir respirar.
Não, sussurram-te. Nada é teu.
Foste um visitante, que repetidas vezes
subiu o monte, cravou a bandeira, proclamou.
Nós nunca te pertencemos.
Tu nunca nos encontraste.
Foi sempre o contrário.
Margaret Atwood, em Lacre, Traduções e Versões de Poesia de Vasco Gato (ed. Língua Morta)
O momento em que, após anos
de labuta e uma longa viagem,
pões o pé no centro do teu quarto,
casa, hectare, quilómetro quadrado, ilha, país,
finalmente consciente de como lá chegaste,
e dizes, isto é meu,
é o mesmo momento em que as árvores
desenlaçam de ti os seus braços macios,
os pássaros recolhem a sua linguagem,
os penhascos estalam e desabam,
o ar recua de ti como uma onda
e ficas sem conseguir respirar.
Não, sussurram-te. Nada é teu.
Foste um visitante, que repetidas vezes
subiu o monte, cravou a bandeira, proclamou.
Nós nunca te pertencemos.
Tu nunca nos encontraste.
Foi sempre o contrário.
Margaret Atwood, em Lacre, Traduções e Versões de Poesia de Vasco Gato (ed. Língua Morta)
Cristina Tavares, B&W, 2017 |
31 janeiro, 2018
Mark Strand
MANTER AS COISAS INTEIRAS
Num campo
eu sou a ausência
de campo.
Acontece
sempre o mesmo.
Onde quer que esteja
sou aquilo que falta.
Ao caminhar
separo o ar
e de todas as vezes
o ar precipita-se
para preencher os espaços
onde o meu corpo esteve.
Todos temos motivos
para nos deslocarmos.
Eu desloco-me
para manter as coisas inteiras.
Mark Strand, em Lacre, Traduções e Versões de Poesia de Vasco Gato (ed. Língua Morta)
Num campo
eu sou a ausência
de campo.
Acontece
sempre o mesmo.
Onde quer que esteja
sou aquilo que falta.
Ao caminhar
separo o ar
e de todas as vezes
o ar precipita-se
para preencher os espaços
onde o meu corpo esteve.
Todos temos motivos
para nos deslocarmos.
Eu desloco-me
para manter as coisas inteiras.
Mark Strand, em Lacre, Traduções e Versões de Poesia de Vasco Gato (ed. Língua Morta)
30 janeiro, 2018
Isadora e Cristina
neste dia há-de descobrir
que dentro do teu tórax
habita uma granada fossilizada
com meu nome gravado
que dentro do teu tórax
habita uma granada fossilizada
com meu nome gravado
Rita Isadora Pessoa
Cristina Tavares, B&W, 2017 |
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29 janeiro, 2018
Ursula K. Le Guin
There’s something
the size of a split pea
that I haven’t written.
that I haven’t written right.
I can’t sleep.
the size of a split pea
that I haven’t written.
that I haven’t written right.
I can’t sleep.
She gets up
and writes it.
Her work
is never done.
and writes it.
Her work
is never done.
Ursula K. Le Guin,The Writer on, and at, Her Work
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Ursula K. Le Guin
28 janeiro, 2018
26 janeiro, 2018
25 janeiro, 2018
24 janeiro, 2018
Ursula K. Le Guin - A pele
THE SKIN
helping keep our bodies in.”
I’ve known that poem sixty years.
There’s more to it than first appears.
If we were skinless, like a cloud,
would we not mingle with the crowd?
Would not our little bodies be
more boundless even than the sea,
and gaseous as the atmosphere?
Would we be there as well as here?
Would I be you, and you be me,
and both of us mere entropy?
The two it takes to tango need
to be discrete, not just discreet.
The skin, however, does have holes
for letting in and out our souls,
our food, and such necessities.
It is designed to serve and please.
It washes well, but with the years
gets wrinkles, little spots and smears,
and somehow doesn’t seem to fit
as seamlessly as once as it did.
But still it is my nomad’s tent,
my shelter, my integument,
the outside of myself, this thin,
seemingly superficial skin,
that hems me neatly all about,
keeping foreign bodies out,
and keeping me, a while yet, in.
Ursula K. Le Guin
23 janeiro, 2018
22 janeiro, 2018
21 janeiro, 2018
Martin e Paula
Martin Gusinde, Selk'nam man dressed for Hain Ceremony, 1923 |
Desenho a coisa até à sua existência - só consigo pensar fazendo .
Paula Rego
16 janeiro, 2018
António José Forte
Cristina Tavares, &C, janeiro 2018 |
Abre um livro fantástico, impossível.
Mas não lê.
Trabalha - numa música secreta, inaudível.
António José Forte
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14 janeiro, 2018
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