17 maio, 2015

Cristina Campo






























Perceber é reconhecer apenas o que tem valor, apenas o que existe realmente. E o que mais existe realmente neste mundo senão o que não é deste mundo?

Cristina Campo, Os Imperdoáveis




Apesar de tudo amo a minha época porque é a época em que falta tudo e, exactamente por isso, talvez seja o verdadeiro tempo do conto de fadas. E é claro que não entendo com isto a era dos tapetes voadores e dos espelhos mágicos, que o homem destruiu para sempre no acto de fabricá-los, mas sim, a época da beleza em fuga, da graça e do mistério prestes a desaparecer, como as aparições e os sinais arcanos do conto de fadas: tudo aquilo a que certos homens nunca renunciam, que quanto mais os apaixona mais parece perdido e esquecido. Tudo o que se vai procurar bem longe, mesmo com risco de vida, como a rosa de Belinda em pleno inverno. Tudo o que sempre se oculta sob peles cada vez mais impenetráveis, no fundo de cada vez mais horrendos labirintos.

Cristina Campo, Os Imperdoáveis





História maravilhosa do Faraó Miquerinos, condenado pelos deuses a morrer jovem. Aos olhos deles não apresenta qualquer graça a sua doce clemência, que traiu o destino trágico do Egipto após as tiranias de Quéops e de Quéfrem.

E ele manda iluminar os seus palácios e os seus parques com milhares de lanternas.
Das noites fará outros tantos dias e assim viverá doze anos em vez dos seis que lhe restam.
É certamente uma parábola do poeta, desse inimigo involuntário da lei da necessidade.
O que pode fazer o poeta injustamente punido senão transformar as noites em dias, as trevas em luz?


Cristina Campo, Os Imperdoáveis


Nenhum comentário: