24 março, 2015

Escrever não mostra o que resta, mas o que falta. Para tocar o fundo. Disso se morre, de escrita. Mas nada vale senão morrer. O sentido revelador disto está em que tudo desaparece com cada um. Morre-se para que o mundo morra, e crime e culpa se dissolvam, como se a escrita – morte alheia e própria – fosse uma espécie de exasperada, misteriosa e emblemática regeneração ..."

Herberto Helder, Profissão: Revólver& ETC, nº19, Janeiro de 1974



Herberto Helder
Herberto Helder, Angola, 1961


Herberto Helder (fotografia do espólio de Alberto Lacerda)

Herberto Helder
(fotografia de Alfredo Cunha, fevereiro de 2015)


Herberto

queria ver se chegava por extenso ao contrário:
força e pulsação e graça,
isto é: a luz, de dentro, despedaçando tudo,
e concentrada:
estrela / estrela

Herberto Helder, A Morte Sem Mestre

Herberto

tão fortes eram que sobreviveram à língua morta,
esses poucos poemas acerca do que hoje me atormenta,
décadas, séculos, milénios,
e eles vibram,
e entre os objectos técnicos no apartamento,
rádio, tv, telemóvel,
relógios de pulso,
esmagam-me por assim dizer com a sua verdade última
sobre a morte do corpo,
dizem apenas: é igual ao pó da terra que não respira,
o que é falso, pois eu é que deixarei de respirar
sobre o pó da terra que respira,
entre o poema sumério e este poema de curto fôlego,
mas que talvez respire um dia,
ou dois, ou três dias mais:
quanto às coisas sumérias: as mãos da rapariga,
o cabelo da estreita rapariga,
a luz que estremecia nela,
tudo isso perdura em mim pelos milénios fora,
disso, oh sim, é que eu estou vivo e estremeço ainda


Herberto Helder, A Morte Sem Mestre

Herberto

como se sabe os poetas não morrem

CT, herberto, 24 março 2015

23 março, 2015

Dorothea Lange

Dorothea Lange, The Road West, New Mexico, 1938

20 março, 2015

Hölderlin e Rachel

Mas nós caminhávamos juntos pela terra, num mútuo contentamento,
Como os cisnes amantes, ao repousarem no lago,
Ou embalados pelas ondas, olhando as águas,
Espelho de nuvens de prata e esteira de azul étereo
Rasgada pelos barcos de passagem.

Hölderlin, Elegias

Rachel Whiteread, Ligth III, 2010

19 março, 2015

                                                                  














                 


   

















 CT, poética, março 2015   

          

16 março, 2015

Porque o belo significa o fim provável dos terrores.

Heiner Müller

15 março, 2015

santa clara

fonte da escola santa clara (Duarte, 10 anos)
O que a memória ama, fica eterno.
Adélia Prado

Adélia Prado

Fluência

Eu fiz um livro, mas oh meu Deus,
não perdi a poesia.
Hoje depois da festa,
quando me levantei para fazer café,
uma densa neblina acizentava os pastos,
as casas, as pessoas com embrulho de pão.
O fio indesmanchável da vida tecia seu curso.
Persistindo, a necessidade dos relógios,
dos descongestionantes nasais.
Meu livro sobre a mesa contraponteava exato
com os pardais, os urinóis pela metade,
o antigo e intenso desejar de um verso.
O relógio bateu sem assustar os farelos sobre a mesa.
Como antes, graças a Deus.

Adélia Prado, Com Licença Poética

14 março, 2015

Adélia

Era um quintal ensombrado, murado alto de pedras.
As macieiras tinham maçãs temporãs, a casca vermelha
do escuríssimo vinho, o gosto caprichado das coisas
fora de seu tempo desejadas.
Ao longo do muro eram talhas de barro.
Eu comia maçãs, bebia a melhor água, sabendo
que o mundo lá fora havia parado de calor.
Depois encontrei meu pai, que me fez festa
e não estava doente e nem tinha morrido, por isso ria,
os lábios de novo e a cara circulados de sangue,
caçava o que fazer pra gastar sua alegria:
onde está meu formão, minha vara de pescar,
cadê minha binga, meu vidro de café?
Eu sempre sonho que uma coisa gera,
nunca nada está morto.
O que não está vivo, aduba.
O que está estático, espera.

Adélia Prado, Com Licença Poética

13 março, 2015

Hölderlin

Para onde irei eu?
Vivem os mortais
De soldo e trabalho;
Alternando em fadiga e repouso
Tudo se alegra; porque não dorme então
Nunca em meu peito o espinho?

Hölderlin, Poemas, trad. Paulo Quintela
Francis Bacon, auto retrato, 1971

Francis Bacon

Francis Bacon, Auto retrato, 1973 

10 março, 2015

E e E

One need not be a chamber to be haunted.

Não precisamos de ser um quarto para se ser assombrado.


Emily Dickinson trad. © Cristina Tavares, 2015

Ellsworth Kelly, Flower Drawing

07 março, 2015

Cy

David Seidner, secretária de Cy Twombly

06 março, 2015

Be patient – even with chaos.

Lydia Davis

05 março, 2015

Marie Sondergaard Lolk, s/título, 2008

04 março, 2015

jean/hans Arp

Jean (Hans) Arp,
fotografia da colecção de Katherine S. Dreier