03 abril, 2015

Não podes suspender um Incêndio -
Uma coisa que arda
Pode ir, por si, sem um Sopro
Pela noite mais lenta –

Não podes cingir uma Inundação
E pô-la numa Gaveta –
Porque os Ventos encontrá-la-iam –
E di-lo-iam ao teu Chão de Cedro -


Emily Dickinsontrad. © Cristina Tavares, 2015

You cannot put a Fire out - /A Thing that can ignite / Can go, itself, without a Fan - / Upon the slowest night - / You cannot fold a Flood - / And put it in a Drawer - / Because the Winds would find it out - /And tell your Cedar Floor -
O meu olhar está mais cheio que a minha jarra 
A Sua Carga – é de Orvalho –
E no entanto –  meu Coração – o meu olhar pesa mais –
Índia Oriental – para ti!


Emily Dickinsontrad. © Cristina Tavares, 2015

My eye is fuller than my vase - / Her Cargo - is of Dew - / And still - my Heart - my eye outweighs - / East India - for you!
Se O que Pudéssemos– fosse o que tivéssemos –
O Critério seria – modesto –
É Fundamento do Falar –
A Impotência de Dizer   


Emily Dickinson trad. © Cristina Tavares, 2015

If What we Could - were what we would - /Criterion - be small -/ It is the Ultimate of Talk -/ The Impotence to Tell -

02 abril, 2015


Não pintarei   um quadro –
Serei antes Um
Com a sua luminosa impossibilidade
Para nele – delicioso  habitar 
E interrogar-me como se sentem os dedos
De quem – celestialmente – se agita e
Evoca de modo doce um tormento
Tão sumptuoso – Desespero –

Não falarei – como Corneta –
Antes serei Uma
Erguida  suavemente para o Horizonte –
E fora, e dentro –
Através dos Povoados do Éter-
Eu sobre o Balão –
Através de um lábio de Metal
Ancoradouro para o meu Pontão   

Nem serei  um Poeta –
É melhor – possuir o Ouvir –
Enamorado – impotente – satisfeito –
A Licença para venerar,
Um privilégio tão terrível
Qual seria o Dote,
tivesse eu a Arte de me espantar
Com Dardos – de Melodia!


Emily Dickinson trad. © Cristina Tavares, 2015


I would not paint - a picture - / I'd rather be the One /It's bright impossibility /To dwell - delicious - on - /And wonder how the fingers feel /Whose rare - celestial - stir - /Evokes so sweet a torment - Such sumptuous - Despair -// I would not talk, like Cornets - /I'd rather be the One / Raised softly to Horizons - /And out, and easy on - /Through Villages of Ether - /Myself up borne Balloon / By but a lip of Metal -/ The pier to my Pontoon - // Nor would I be a Poet - /It's finer - own the Ear - /Enamored - impotent - content - /The License to revere, /A privilege so awful /What would the Dower be, /Had I the Art to / stun myself / With Bolts - of Melody! 

cabeça no Ar

Rebecca Sferzo, Paintbrush Portraits
cabeça no Ar
corpo na pintura

Rebecca Sferzo

Rebecca Sferzo,
Paintbrush Portraits
será que vejo a E. em todo o lado?
(...) a poesia é a relação pura do homem com as coisas. Isto é: uma relação com a realidade, tomando-a na sua pura existência. O poeta é aquele que vive com as coisas, que está atento ao real, que sabe que as coisas existem.

Sophia de Mello Breyner Andresen, Colóquio, nº8, Abril 1960

28 março, 2015

Março é o Mês da Expectativa.
As coisas que não conhecemos –
As pessoas que fazem previsões
Vêm agora –
Tentamos mostrar alguma firmeza –
Mas a pomposa Alegria
Trai-nos, como o primeiro Noivado
Trai um Rapaz.

Emily Dickinson , trad. © Cristina Tavares, 2015


March is the Month of Expectation./The things we do not know – / The Persons of prognostication / Are coming now – /We try to show becoming firmness – / But pompous Joy / Betrays us, as his first Betrothal / Betrays a Boy.


26 março, 2015

Emily e eu e Ilse

A Beleza não se provoca – Ela é –
Persegue-a, e ela cessa 
Não a procures, e ela habita.



Emily Dickinson , trad. © Cristina Tavares, 2015

Beauty is not caused — It is — / Chase it, and it ceases — / Chase it not, and it abides.

Ilse Bing, Paris, 1952





25 março, 2015

herberto - a sua matéria fugitiva

... Os símbolos saem da noite terrena - rápidos e luzentes - referidos como flores ou pássaros, e a mesma noite reabsorve a sua matéria fugitiva. Porque a noite não é terna. Desta noite que fermenta silenciosamente destaca-se o nosso vocabulário, ele já sistema básico de símbolos, pronto para o jogo e o uso apocalípticos. Mexer neste vocabulário é uma incorrência em perigos incógnitos, e nessa aventura (e não nas passagens fotográficas) lavra-se a biografia criminal, e a exposição à morte. (...)

Herberto Helder; Profissão: Revólver& ETC, nº19, Janeiro de 1974


Vivian Maier, Chicago, Junho 1963

24 março, 2015

Escrever não mostra o que resta, mas o que falta. Para tocar o fundo. Disso se morre, de escrita. Mas nada vale senão morrer. O sentido revelador disto está em que tudo desaparece com cada um. Morre-se para que o mundo morra, e crime e culpa se dissolvam, como se a escrita – morte alheia e própria – fosse uma espécie de exasperada, misteriosa e emblemática regeneração ..."

Herberto Helder, Profissão: Revólver& ETC, nº19, Janeiro de 1974



Herberto Helder
Herberto Helder, Angola, 1961


Herberto Helder (fotografia do espólio de Alberto Lacerda)

Herberto Helder
(fotografia de Alfredo Cunha, fevereiro de 2015)


Herberto

queria ver se chegava por extenso ao contrário:
força e pulsação e graça,
isto é: a luz, de dentro, despedaçando tudo,
e concentrada:
estrela / estrela

Herberto Helder, A Morte Sem Mestre

Herberto

tão fortes eram que sobreviveram à língua morta,
esses poucos poemas acerca do que hoje me atormenta,
décadas, séculos, milénios,
e eles vibram,
e entre os objectos técnicos no apartamento,
rádio, tv, telemóvel,
relógios de pulso,
esmagam-me por assim dizer com a sua verdade última
sobre a morte do corpo,
dizem apenas: é igual ao pó da terra que não respira,
o que é falso, pois eu é que deixarei de respirar
sobre o pó da terra que respira,
entre o poema sumério e este poema de curto fôlego,
mas que talvez respire um dia,
ou dois, ou três dias mais:
quanto às coisas sumérias: as mãos da rapariga,
o cabelo da estreita rapariga,
a luz que estremecia nela,
tudo isso perdura em mim pelos milénios fora,
disso, oh sim, é que eu estou vivo e estremeço ainda


Herberto Helder, A Morte Sem Mestre

Herberto

como se sabe os poetas não morrem

CT, herberto, 24 março 2015

23 março, 2015

Dorothea Lange

Dorothea Lange, The Road West, New Mexico, 1938

20 março, 2015

Hölderlin e Rachel

Mas nós caminhávamos juntos pela terra, num mútuo contentamento,
Como os cisnes amantes, ao repousarem no lago,
Ou embalados pelas ondas, olhando as águas,
Espelho de nuvens de prata e esteira de azul étereo
Rasgada pelos barcos de passagem.

Hölderlin, Elegias

Rachel Whiteread, Ligth III, 2010

19 março, 2015

                                                                  














                 


   

















 CT, poética, março 2015   

          

16 março, 2015

Porque o belo significa o fim provável dos terrores.

Heiner Müller

15 março, 2015

santa clara

fonte da escola santa clara (Duarte, 10 anos)
O que a memória ama, fica eterno.
Adélia Prado