AO AMANHECER
A manhã desaba como uma pilha de pratos
Em milhares de cacos de porcelana e de horas
E de seixos
E de cascatas
Até sobre o balcão desta tasca muito pobre
Onde as estrelas persistem na noite do café.
Em milhares de cacos de porcelana e de horas
E de seixos
E de cascatas
Até sobre o balcão desta tasca muito pobre
Onde as estrelas persistem na noite do café.
Ela não é pobre
Aquela, no seu vestido de noite sujo de lama,
Mas rica das realidades da manhã,
Da embriaguez do seu sangue
Mas rica das realidades da manhã,
Da embriaguez do seu sangue
E do perfume do seu hálito que nenhuma insónia pode alterar.
Rica de si mesma e de todas as manhãs
Passadas, presentes e futuras,
Rica de si mesma e do sono que a vence
Do sono rígido como um acaju
Do sono e da manhã e de si mesma
Rica de si mesma e de todas as manhãs
Passadas, presentes e futuras,
Rica de si mesma e do sono que a vence
Do sono rígido como um acaju
Do sono e da manhã e de si mesma
E de toda a sua vida que não se conta
Senão por manhãs, auroras deslumbrantes
Cascatas, sonos,
Noites vivas.
Senão por manhãs, auroras deslumbrantes
Cascatas, sonos,
Noites vivas.
Ela é rica
Mesmo se estende a mão
E tem de dormir na fresca manhã
No seu vestido sujo
Num leito de deserto
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E tem de dormir na fresca manhã
No seu vestido sujo
Num leito de deserto
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CANTO DO CÉU
A flor dos
Alpes dizia à concha: «tu brilhas»
A concha dizia ao mar: «tu ressoas»
O mar dizia ao barco: «tu tremes»
O barco dizia ao fogo: «tu cintilas»
O fogo dizia-me: «cintilo menos que os seus olhos»
O barco dizia-me: «tremo menos que o teu coração quando ela aparece
O mar dizia-me: «ressoo menos que o seu nome no teu amor»
A concha dizia-me: «brilho menos que o fósforo do desejo no teu sonho fundo»
A flor dos
Alpes dizia-me: «ela é bela»
Eu dizia: «ela é bela, ela é bela, ela é comovente».
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A flor dos
Alpes dizia à concha: «tu brilhas»
A concha dizia ao mar: «tu ressoas»
O mar dizia ao barco: «tu tremes»
O barco dizia ao fogo: «tu cintilas»
O fogo dizia-me: «cintilo menos que os seus olhos»
O barco dizia-me: «tremo menos que o teu coração quando ela aparece
O mar dizia-me: «ressoo menos que o seu nome no teu amor»
A concha dizia-me: «brilho menos que o fósforo do desejo no teu sonho fundo»
A flor dos
Alpes dizia-me: «ela é bela»
Eu dizia: «ela é bela, ela é bela, ela é comovente».
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Robert Desnos (França, 1900-1945)
(trad.Cristina Tavares/José Pinto de Sá)
(trad.Cristina Tavares/José Pinto de Sá)