Há seres que são mais imagem que matéria
mais olhar do que corpo
tão imateriais os amamos
que quase não queremos tocá-los com palavras
desde a infância os buscamos
mais no sonho que na carne
e sempre no limiar dos lábios
a luz da manhã parece dizê-los
Homero Aridjis
18 abril, 2007
17 abril, 2007
O Catador
Um homem catava pregos no chão.
Sempre os encontrava deitados de comprido,
ou de lado,
ou de joelhos no chão.
Nunca de ponta.
Assim eles não furam mais - o homem pensava.
Eles não exercem mais a função de pregar.
São patrimónios inúteis da humanidade.
Ganharam o privilégio do abandono.
O homem passava o dia inteiro nessa função de catarpregos enferrujados.
Acho que essa tarefa lhe dava algum estado.
Estado de pessoas que se enfeitam a trapos.
Catar coisas inúteis garante a soberania do Ser.
Garante a soberania de Ser mais do que Ter.
Manoel de Barros, "Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo"
Um homem catava pregos no chão.
Sempre os encontrava deitados de comprido,
ou de lado,
ou de joelhos no chão.
Nunca de ponta.
Assim eles não furam mais - o homem pensava.
Eles não exercem mais a função de pregar.
São patrimónios inúteis da humanidade.
Ganharam o privilégio do abandono.
O homem passava o dia inteiro nessa função de catarpregos enferrujados.
Acho que essa tarefa lhe dava algum estado.
Estado de pessoas que se enfeitam a trapos.
Catar coisas inúteis garante a soberania do Ser.
Garante a soberania de Ser mais do que Ter.
Manoel de Barros, "Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo"
30 março, 2007
27 março, 2007
23 março, 2007
21 março, 2007
"(...)
- O barulho do mar e do vento. A montanha, a ideia da montanha impraticável. E depois a terra arenosa por ali fora. E a solidão. E sentir sobretudo que já não pode haver medo. Fecho as portas da casa, a porta de saída e as portas dos quartos entre si. E fico no quarto sem soalho e deito-me no chão. Ouço o mar e o vento à frente e atrás da montanha solitária e poderosa. Depois encosto a cara à terra profundíssima para escutar o seu húmido susurro atravessando-a toda e passando por mim. E então poderei morrer."
Herberto Helder, "Os Passos em Volta"
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18 março, 2007
(...)
Mas em Amsterdão nem sequer existia a rua que o meu amigo tinha indicado e claro, nunca houve em qualquer parte da terra um homem chamado Max Hughes que conseguisse embarcar gente para Singapura. Às vezes chego a pensar que não existe nenhuma cidade com tal nome. mas não é nem nunca foi essencial. A comoção e a esperança, sim, essas existem, e são o tema dos nossos dons, a nossa tarefa. E é nelas próprias que o milagre do mundo pode ser concebido.
Herberto Helder, "Os Passos em Volta"
17 março, 2007
(...) Contaram-me que ele tinha uma alegria tão grande que não podia agarrar num copo: quebrava-o com a força dos dedos, com a grande força da sua alegria. Era uma criatura excepcional. Depois foi-se embora, e até já desconfiavam dele, e embarcou, e talvez não houvesse lugar na terra para ele. E onde está? Mas era uma alegria bárbara, uma vocação terrível. Partiu. E agora chove, e vamos para casa, e tomamos chá, e comemos aqueles bolos de que tu gostas tanto. E depois, e depois? Ele era belo e tremendo, com aquela sua alegria, e não tinha medo, e só a vibração interior da sua alegria fazia com que os copos se quebrassem entre os dedos. Foi-se embora."
Herberto Helder, "Os Passos em Volta"
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16 março, 2007
15 março, 2007
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