22 abril, 2016

esperar

Nuno Campos, Trip #1, 2002


























Não há mais sublime sedução do que saber esperar alguém.
Compor o corpo, os objectos em sua função, sejam eles
A boca, os olhos, ou os lábios. Treinar-se a respirar
Florescentemente. Sorrir pelo ângulo da malícia.
Aspergir de solução libidinal os corredores e a porta.
Velar as janelas com um suspiro próprio. Conceder
Às cortinas o dom de sombrear. Pegar então num
Objecto contundente e amaciá-lo com a cor. Rasgar
Num livro uma página estrategicamente aberta.
Entregar-se a espaços vacilantes. Ficar na dureza
Firme. Conter. Arrancar ao meu sexo de ler a palavra
Que te quer. Soprá-la para dentro de ti -------------------
----------------------------- até que a dor alegre recomece.


Maria Gabriela Llansol, O Começo de um Livro é Precioso

21 abril, 2016

Filipe Branquinho

Filipe Branquinho, Casa de Ferro, Sala de espera, Maputo, 2014

Filipe Branquinho, Cine África, WC, Maputo, 2014



20 abril, 2016

coração




CT, divertissement, abril 2016 















Sempre. Dormiram, acordaram, esgotaram-se. Vivem na escuridão, no vácuo. Têm mãos. Respiram sombriamente sobre as mãos.
Depois param.
Então criam a festa. As forças irrompem do fundo; fazem vacilar o fino e o precário equilíbrio da terra. Para lá da lei abolida, as coisas tornam-se vísiveis, com uma intensidade, uma transparência anterior: sinais, vozes, tudo. Como se o mundo inteiro curasse uma ressaca no corpo de cada um, e essa límpida desordem deixasse o coração escorrido.
É a festa dos homens.


Herberto Helder, Os Passos em Volta

19 abril, 2016

no meio está uma fogueira

Alfredo Cunha, Salgueiro Maia, 25 de Abril de 1974






















Esta linguagem é pura. No meio está uma fogueira
e a eternidade das mãos.
Esta linguagem é colocada e extrema e cobre, com suas
lâmpadas, todas as coisas.
As coisas que são uma só no plural dos nomes.
- E nós estamos dentro, subtis e tensos
na música.

Herberto Helder, Poesia Toda

desenhos de maio (abril)


CT, Lathyrus tingitanus (da série desenhos de maio),abril 2016























A imagem é simples.
Uma nuvem grossa
que respira fundo e o céu
alga transparente.
Mesmo ao lado
à esquerda
está a nossa felicidade
na terrível 
e momentânea
evidência do sol.

CT, Lago, 1994

18 abril, 2016

Iathyrus tingitanus

                                                                    CT, Lathyrus tingitanus (da série desenhos de maio),abril 2016

Brian Patten, ainda


Uma folha de erva


Pedes-me um poema.
Ofereço-te uma folha de erva.
Dizes que não chega.
Pedes-me um poema.

Eu digo que esta folha de erva basta.
Vestiu-se de orvalho.
É mais imediata
Do que alguma imagem minha.

Dizes que não é um poema.
É uma simples folha de erva e a erva
Não é suficientemente boa.
Ofereço-te uma folha de erva.

Estás indignada.
Dizes que é fácil oferecer uma folha de erva.
Que é absurdo.
Qualquer um pode oferecer uma folha de erva.

Pedes-me um poema.
E então escrevo uma tragédia àcerca
De como uma folha de erva
Se torna cada vez mais difícil de oferecer

E de como quanto mais envelheces
Uma folha de erva
Se torna mais difícil de aceitar.


Brian Patter (trad. Jorge de Sousa Braga)

Brian Patten

You lose your love for her and then
It is her who is lost,
And then it is both who are lost,
And nothing is ever as perfect as you want it to be.

In a very ordinary world
A most extraordinary pain mingles with the small routines,
The loss seems huge and yet
Nothing can be pinned down or fully explained.

You are afraid.
If you found the perfect love
It would scald your hands,
Rip the skin from your nerves,
Cause havoc with a computered heart.

You lose your love for her and then it is her who is lost.
You tried not to hurt and yet
Everything you touched became a wound.
You tried to mend what cannot be mended,
You tried, neither foolish nor clumsy,
To rescue what cannot be rescued.

You failed,
And now she is elsewhere
And her night and your night
Are both utterly drained.

How easy it would be
If love could be brought home like a lost kitten
Or gathered in like strawberries,
How lovely it would be;
But nothing is ever as perfect as you want it to be. 

17 abril, 2016

seis exercícios com a noite

 CT, seis exercícios com a noite,
16.abr.16






para os que não sabem ver

Constantin Brancusi, Sculpture for the Blinds, 1925

16 abril, 2016

Brancusi

Simplicidade é a complexidade resolvida.
Constantin Brancusi

Constantin Brancusi, Sleeping Muse I, 1909-10

working upon you

So you must not be frightened … if a sadness rises up before you larger than any you have ever seen; if a restiveness, like light and cloud-shadows, passes over your hands and over all you do. You must think that something is happening with you, that life has not forgotten you, that it holds you in its hand; it will not let you fall. Why do you want to shut out of your life any agitation, any pain, any melancholy, since you really do not know what these states are working upon you?



Rainer Maria Rilke


Alexander McQueen

15 abril, 2016

Malick Sidibé (1936-2016)

Malick Sidibé, Vues de Dos, 2001-2011
Malick Sidibé, Vues de Dos, 2001-2011




































Where the myth fails, human love begins. Then we love a human being, not our dream, but a human being with flaws. 


Anaïs Nin


Emily e Adrienne

CT, Emily (crowend head), 2014


























The study of silence has long engrossed me. The matrix of a poet’s work consists not only of what is there to be absorbed and worked on, but also of what is missing, desaparecido, rendered unspeakable, thus unthinkable. It is through these invisible holes in reality that poetry makes its way — certainly for women and other marginalized subjects and for disempowered and colonized peoples generally, but ultimately for all who practice any art at its deeper levels. The impulse to create begins — often terribly and fearfully — in a tunnel of silence. Every real poem is the breaking of an existing silence, and the first question we might ask any poem is, What kind of voice is breaking silence, and what kind of silence is being broken?


Adrienne Rich , “Arts of the Possible : Essays and Conversations”

Ellsworth e Anaïs

    You live out the confusions until they become clear.
Anaïs Nin

Ellsworth Kelly, Barn, Southampton, 1968

Ellsworth Kelly, Sidewalk, Los Angeles, 1978
Ellsworth Kelly, Pine Branch and Shadow, Meschers, 1950

Ellsworth Kelly, Beach Cabana,Meschers, 1950

Ellsworth Kelly, Hangar Doorway, St Barthélemy, 1977

Ellsworth Kelly, Sidewalk, NY,1970


ao lado das abelhas

 CT, music to my ears (ao lado das abelhas), 2016
 

13 abril, 2016

sobre a cabeça de Pedro Burmester

CT, music to my ears (sobre a cabeça de Pedro Burmester),2016


























a queimada que fez na silvas em volta da casa
descontrolou-se ao vento levantado de repente,
e naquele tempo em que já lhe não tocava qualquer beleza
ele ficou a olhar a beleza assassina:
as labaredas abraçaram-no todo,
tornando-se então ele mesmo a sua morte abraçada:
e mais ninguém sabia que a beleza se consuma
num abraço a vento e ar alto
com fogo dentro


Herberto Helder, 
RELÂMPAGO nº 36/37




12 abril, 2016

Foi assim. É assim. Arquejar. Suster a respiração.

Peter Handke, Os Belos Dias de Aranjuez

CT, music to my ears, 2016

11 abril, 2016

music to my ears

CT, music to my ears, sobre a cadeira de Hockney, abril 2016


CT, music to my ears,
sobre "Interior de Montcalm, com dois cães,de Hockney,
abril 2016

























10 abril, 2016





























For they are the moments when something new has entered into us, something unknown; our feelings grow mute in shy perplexity, everything in us withdraws, a stillness comes, and the new, which no one knows, stands in the midst of it and is silent.

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We cannot say who has come, perhaps we shall never know, but many signs indicate that the future enters into us in this way in order to transform itself in us long before it happens. And this is why it is so important to be lonely and attentive when one is sad: because the apparently uneventful and stark moment at which our future sets foot in us is so much closer to life than that other noisy and fortuitous point of time at which it happens to us as if from outside.

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As people were long mistaken about the motion of the sun, so they are even yet mistaken about the motion of that which is to come. The future stands firm … but we move in infinite space.

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That is at bottom the only courage that is demanded of us: to have courage for the most strange, the most singular and the most inexplicable that we may encounter.


Rainer Maria Rilke