02 janeiro, 2015

"Querida imaginação, o que mais amo em ti, é que tu não perdoas."

André Breton, Manifesto Surrealista

Anne-Karin Furunes

Anne-Karin Furunes, Displacement, 2011

01 janeiro, 2015

Anish Kapoor

Anish Kapoor, Sky Mirror, Red, 2009

31 dezembro, 2014

Sleepless





CT, 2014, Sleepless  (da série Sleeping Head)



30 dezembro, 2014

Edouard Boubat

Edouard Boubat, Rémi Listening to the Sea,1955

Paul Celan

(...)

di-lo, como se eu fosse este 
teu branco,
como se tu fosses
o meu,

(...)

Paul Celan, Sete Rosas Mais Tarde

28 dezembro, 2014





Ingeborg Bachmann e Paul Celan, 1952
























Uma Espécie de Perda

Usámos a dois: estações do ano, livros e uma música.
As chaves, as taças de chá, o cesto do pão, lençóis de linho e uma cama.
Um enxoval de palavras, de gestos, trazidos, utilizados, gastos.
Cumprimos o regulamento de um prédio.Dissemos.Fizemos.E estendemos sempre a mão.

Apaixonei-me por Invernos, por um septeto vienense e por Verões.
Por mapas, por um ninho de montanha, uma praia e uma cama.
Ritualizei datas, declarei promessas irrevogáveis,
idolatrei o indefinido e senti devoção perante um nada,

(o jornal dobrado, a cinza fria, o papel com um apontamento)
sem temores religiosos, pois a igreja era esta cama.

De olhar o mar nasceu a minha pintura inesgotável.
Da varanda podia saudar os povos, meus vizinhos.
Ao fogo da lareira, em segurança, o meu cabelo tinha a sua cor mais intensa.
A campainha da porta era o alarme da minha alegria.

Não te perdi a ti,
perdi o mundo.

Ingeborg Bachmann, O Tempo Aprazado
Sob um céu estranho
sombras rosas
sombras
numa terra estranha
entre rosas e sombras
numa água estranha
a minha sombra

Ingeborg Bachmann, O Tempo Aprazado

27 dezembro, 2014


Minor White, 1958



Minor White, The Sound of One Hand Clapping, 1957


Minor White, Gloucester, 1973
Minor White, Vicinity of Rochester, 1954

Conversa à Mesa

Morremos de vez, é certo.
Por isso, a vida é uma coisa,
De que acontece, ou não, gostar.

Mas sendo assim, porque me acontece
Gostar do mato vermelho,
Da erva cinzenta e do céu verde-cinza?

E que mais? Mas, vermelho,
Cinzento, verde, porquê, especialmente?
Não foi isso que eu disse:

Não esses, especialmente. Apenas, esses.
Gostamos do que acontece gostarmos.
Gostamos da maneira como o vermelho cresce.

Não tem nenhuma importância.
Acontecer gostar é uma das maneiras
Que as coisas têm de acontecer.

Wallace Stevens, Antologia  

26 dezembro, 2014

Paul Strand, Rebecca,1922

Separando a erva dos prados, aspirando o seu raro aroma,
Dela reclamo a espiritualidade,
Exijo o mais íntimo e abundante companheirismo entre os homens,
Peço que ergam as suas folhas as palavras, actos, seres,
Esses de límpidos ares, rudes, solares, frescos, férteis,
Esses que traçam o seu próprio caminho, erectos  e livres avançando, conduzindo e não                                                                                                                              conduzidos,
Esses de indomável audácia, de doce e veemente carne sem mácula,
Esses que olham de frente, imperturbáveis, o rosto dos presidentes e governadores como                                                                                                    se dissessem Quem és tu ?
Esses de natural paixão, simples, nunca constrangidos, insubmissos,
Esses de dentro da América.

Walt Whitman, Cálamo

25 dezembro, 2014

Satã

7.

Há quem chame «poeta» àquele que «faz» poemas.

Mas os poemas não se fazem, nem poeta tem directa
relação com poema. Poema, justamente, é
aquilo que não se faz, que está além do fazer. Ser Poeta
é ter um busto – até pode ser o da república – empedernido nas
células, no peito, nas falanges dianteiras do corpo... O poema 
existe. Está lá, num «lá» encoberto a que apenas chegam os que
, removidos da alma, esperam infinitamente.


8.
Para o António Cândido Franco


Quando consigo ler aquilo que Pascoaes escreveu
, experimento um calafrio nuclear na boca e uma vontade
periódica de gritar. Nunca me transporto para Amarante,
nem me sinto encarnar árvore em S. João de Gatão...
... às vezes nem me recordo do focinho avatar
com que sempre planeou as fotografias
em que se deixou fixar.
Aquilo que Pascoaes escreveu ainda não foi escrito.
É um lento e pesaroso meio-dia dos vocábulos, uma via-sacra
que ele abriu com o desenho em branco da sua caligrafia loira
, redonda, povoada de anjos e cristos aguarelados.



15.

Ainda não era noite, quando, na forja
do café, ardi um dedo no que de mais digital
o confecciona. Adivinhei, como não sabia que se podia adivinhar,
o torrão externo do tacto. E sobrou ter a minha pele agarrada
àquela grelha invisivelmente ardente, para
, pela primeira vez, Ver a impressão do que me toca
invés da habitual intuição de tocar. Tocar
pele e ter tocada a pele, são duas substâncias tão distintas
e removidas da realidade nuclear dos sentidos,
que se torna insuportável pensar que não
se sabe, nem por estimação, daquilo que experimenta o que nos toca, a menos que, por um segundo, o fogo-real-que-queima
, nos acenda... um dedo
, que seja



19.

A luz de um cair-da-tarde no fim de Março
traz uma representação de desesperança
que nem o sono alivia no cansaço.
Com a insolência distinta dos pombos,
os céus tornam-se sonorosos, verdes-escuro,
apartando os anjos das almas que os refletem.
Pior seria ter de andar pelo campo,
respirar fedores de terra e sementes de trigo,
ver bois ao longe com medo de estarem perto,
ou ser tentado a colher uma réstia de flor como
acto de contrição por todo o mal de ter nascido.
Antes a cidade e a luz eléctrica: iluminação
pública, semáforos.
Antes passeadouros a imitar canais venezianos.



21.

ao adormecer Li uns versos em alemão
e, porque não sei alemão, tudo me constou certo
, amplo, verdadeiramente amplo,
verdadeiramente certo.
Aqueles versos fluíram-me pelas veias
no clamor adorável de cada sentença.
Aventuro agora dizer que encetei bem o dia,
pois que nutri, lendo versos em alemão, é
exactamente a ignorância que desejo aos
que lêem os meus versos portugueses.


Frederico Mira George, Satã, 2011
Sê tão feliz como se eu estivesse contigo. (Não penses que não estou agora junto a ti).
Walt Whitman, Cálamo
Pleno de vida agora, concreto, visível,
Eu, aos quarenta anos de idade e aos oitenta e três dos Estados Unidos,
A ti que viverás dentro de um século ou vários séculos mais,
A ti, que ainda não nasceste, me dirijo, procurando-te.

Quando leres isto, eu que era visível, serei invisível
Agora és tu, concreto, visível, aquele que me lê, aquele que me procura,
Imagino quanto serias feliz se eu estivesse a teu lado e fosse teu companheiro,
Sê tão feliz como se eu estivesse contigo. (Não penses que não estou agora junto a ti).

Walt Whitman, Cálamo

23 dezembro, 2014


John Stezaker, Old Mask III, 2006

John Stezaker, Pair IV, 2007

























22 dezembro, 2014

Ilse Bing, Autoretrato,Paris, 1931



Ilse Bing, Renata and Her Sister, 1934

21 dezembro, 2014

Ilse Bing, Cancan Dancer, Moulin Rouge,1931